segunda-feira, 10 de junho de 2013

O mundo intergaláctico de Aninha


Ter um filho com paralisia cerebral é a experiência mais empolgante que existe. Eu nunca havia imaginado que isso fosse possível. Mas é. A principal característica de uma criança com paralisia cerebral é a dificuldade que ela encontra para vencer a força da gravidade. É como se fosse continuamente perseguida por um lutador de judô alucinado, que se diverte em passar-lhe rasteiras e imobilizá-la no chão. O que ela precisa aprender a fazer, desde o nascimento, é responder aos golpes desse seu adversário gravitacional. Vai pulando de faixa branca para faixa amarela, de faixa amarela para faixa verde, até atingir o seu limite máximo. Todas as habilidades motoras que adquirimos de modo automático, através do instinto, ela tenta adquirir com o raciocínio, com o exercício, com a perseverança. É a luta do intelecto contra a natureza selvagem. Não ligo que ela fique para sempre faixa branca, pois ela fez de mim faixa preta, em qualquer assunto, qualquer aspecto.
A metáfora perfeita da história da humanidade. Davi contra Golias.
Uma criança com paralisia cerebral é como a maçã de Newton, que, caindo, revela os mecanismos secretos de funcionamento do mundo. Quando as pessoas descobrem que minha filha tem paralisia cerebral, costumam olhar para ela com uma mistura de simpatia e condescendência. Eu olho para ela como se olhasse para um troféu, com reverência, devoção, gratidão e sentimento gigante. Dizem que, por causa da ausência de gravidade, uma criança com paralisia cerebral estaria mais bem preparada que todos nós para viver na lua. Minha filha, portanto, é o mulher do futuro, pronto para viagens interplanetárias. Sabe aquele episódio de Jornada nas Estrelas em que alienígenas de uma galáxia distante cismam que o capitão Kirk é a encarnação de Deus? Pois eu sou como os alienígenas, e o minha filha é o capitão Kirk.
O sentimento é comum a todos aqueles que se veem nessa situação: a incompetência dos médicos, o despreparo dos enfermeiros, o descaso do poder público o terrorismo dos fisioterapeutas, a incapacidade dos pais em aceitar os diagnósticos mais negativos, a dedicação maníaca aos exercícios
relação a essas outras, a dificuldade da minha protagonista é apenas mais evidente. Com a vantagem de que ela está preparado para viagens interplanetárias. Essas que a a gente viaja todo dia do "Mundinho particular e intergaláctico de Ana."
Deixo que ela siga feliz, lutando judô e viajando nessa galáxia que ela me propõe visitar todos os dias.

Não é fácil... mas podemos ver as estrelas.

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