terça-feira, 14 de agosto de 2012

A minha culpa ?

A culpa

No meu caso especificamente culpei o médico que acompanhou minha gestação no início, culpei a equipe de enfermagem do hospital, questionei a maneira como eles conduziram o meu parto (prematuro), a falta de estrutura para receber um bebê prematuro, (realmente deixaram a desejar) mas ninguém fez de propósito, eu sei ! Não dependia deles , cidade pequena sem recurso nenhum, talvez tudo poderia ter sido diferente, as seqüelas seriam bem menores, culpei pelo um susto que tomei e uma crise nervosa que passei, me culpei por não ter ido para uma grande cidade para ser acompanhada pelos melhores médicos, me culpei por ter engravidado na hora errada (muito cedo) isso deu tudo errado, enfim, desculpas é o que não faltam nessas horas. Claro que cada caso é um caso, sabemos sim de mães relapsas que sequer fazem o pré-natal, mas estou considerando as mães que sempre desejaram muito um filho, que seguiram a risca todo o pré-natal e tiveram um filho especial.
Após essa fase de tentativas de achar o culpado da história vi que isso não ia me levar a lugar algum, pelo contrário, esse tipo de atitude apenas nos paralisa e nos impede de seguir em frente e encarar a nossa realidade. Desisti então de buscar justificativas para o problema ocorrido na gestação e no hospital

Ainda quando Ana Laura estava na UTI não consegui assimilar muito bem o seu problema, os médicos falavam, falavam, falavam e parecia que eu entendia tudo, quando na verdade não entendia nada ou não queria entender naquele momento, eu só queria tirar minha bebê daquele lugar onde o som das máquinas (ventilador mecânico, Oxímetro, etc...) fica até hoje na minha cabeça um Pi pi pi infernal !
Depois de alguns dias já em casa eu percebia que ela era diferente, então começaram as crises convulsivas, Eis que então cai a ficha: minha filha é especial e será dependente de mim e das pessoas que conviverem com ela. E agora??
Como um castelo de areia desmoronando vão-se embora aqueles sonhos, aqueles planos para o futuro, o desejo de ter um filho correndo pela casa quebrando tudo, depois em uma boa universidade, de participar da formatura, do seu casamento, dentre tantos outros sonhos. Aquela outra criança já não existe mais, passei pela fase de luto como já descrevi em outro post até a assimilação da nova realidade que eu tinha pela frente.
Mas de repente tudo muda... O nosso olhar muda, a vida ganha outro sentido, nossas atitudes não são mais as mesmas, estamos mais fortes, amadurecemos em dias o que gastaríamos anos para compreender e todos nos perguntam: de onde você tira tanta força para cuidar da sua filha? Me dá vontade de responder: "É ela quem cuida de mim".
E juntas vamos caminhando, superando todos os obstáculos, descobrindo as pequenas e boas coisas da vida, construindo novos sonhos e vivendo intensamente cada dia como se fosse único.
Minha filha é aquela mesma criança que desejei quando engravidei, algumas coisas mudaram, mas os sentimentos não mudam. Ser mãe de uma criança especial é simplesmente ser mãe, é se doar incondicionalmente como faríamos com qualquer outro filho, amando-o hoje e sempre, mas com muito mais coragem e garra.


A culpa sempre vai me acompanhar... mesmo eu sabendo que ela não me pertence. Assim são as Mães Especiais! Não tem jeito.

O Pesadelo acabou ?


Foram longos 2 meses de internação da Aninha na UTI, muitas complicações, icterícia, pneumonia, derrame pleural, perda de peso, ela chegou a pesar 1.200kg, eu a visitava todos os dias, mesmo sem poder pegá-la no meu colo, eu colocava a mão dentro da incubadora com medo de mexer e desligar um dos inúmeros fios ligados a ela, os médicos não davam esperança nenhuma de vida, então eu saía de casa sem saber se ia encontrar minha filha viva… não desistí, mas paguei caro o preço da minha valentia, sacrifiquei minha saúde, me despersonalizei, cheguei a pesar 40 quilos, quando me envolví demais com a patolologia de Ana, acabei rompendo laços, familiares, sociais,profissionais, me adaptei ao ambiente agressivo do hospital, o ruído dos aparelhos e alarmes, as emoções dramáticas dos corredores, tive distúrbios alimentares e do sono, depressão… Numa dessas idas e vindas para o hospital visitar Aninha, os Doutores disseram que tudo tinha piorado de vez, e que ela estava com uma grande infecção, e então o desespero tomou conta de mim, eu estava prestes a perder minha filha e não podia fazer nada! Aí começou a revolta, eu briguei com Deus, eu afastei pessoas importantes de perto de mim que queriam ajudar mas na verdade eu precisava ficar sozinha para digerir aquela dor que era minha! O desespero era avassalador e eu como sempre gostava de registrar tudo o que acontecia, mas diante daquele sofrimento eu decidí não tirar as fotos e as que tinha tirado eu dei fim, era como se eu não quizesse lembrar daquilo tudo, ficou só uma foto que foi a encubadora em que Aninha ficou por longos 2 meses… Eu não queria ver uma foto dela totalmente desfigurada, ligada a fios e fios, cheia de hematomas, lugares faltando peles, pontos de sutura, uma magreza extrema, hoje me arrependo de ter apagado tudo, pois isso ficou guardado na minha memória, e vira e mexe eu me lembro da situação em que ela se encontrou… Eu era muito menina, o pai de Ana muito imaturo, não me passava apoio e segurança (não o faz até hoje), enfim… A minha maior alegria e susto, foi quando cheguei a sua encubadora e ela estava vazia! Eu Gelei e logo pensei: Ela não resistiu… minha mãe estava no vidro e já em lágrimas fazia gestos desesperados… até que a enfermeira encostou a mão sutilmente em meu ombro e disse: Sua filha está fora de perigo! Ela já conseguiu sair do respirador e só vai ficar internada para ganhar peso para ir para casa! Foi quando pela primeira vez eu pude pegar ela nos meus braços, o momento foi incrível, mamãe chorava demais como se não estivesse acreditando, porque realmente foi um milagre. Lembro-me que ela cabia na palma de minha mão e eu toda desajeitada tentando arrumar ela junto ao meu peito, ela vestia um pijaminha todo já gasto com emblema do hospital, e eu mais do que depressa peguei a malinha e a vestí com uma bela roupinha rosa. Foram algumas semanas até eu aprender a lidar com a sonda nasal e depois ela se adaptou com a chuquinha e podemos vir embora para casa!
Eu sussurava todos os dias em seu ouvidinho: Aguenta firme minha menina, mamãe vai levar você daqui! e a hora de ir embora era a pior de todas, pois era meia hora de visita por dia, eu me acabava em lágrimas, havia dias que minhas pernas não obedeciam e eu não sabia nem onde era o elevador e a porta de saída. Chegou o grande dia! A alta do hospital, minha filha tinha já quase 3 meses e só conhecia aquela encubadora, jalecos azuis e gente estranha... era hora de lar doce lar.
Essa foto foi a primeira vez em que Aninha dormiu no seu bercinho rosa que já estava desacreditado em recebê-la, reparem que tem uma falha no cabelinho, foi onde caiu por ficar tanto tempo em uma posição só.

Minha casa foi abençoada esse dia, pois um anjinho veio morar nela.